samedi 29 juin 2013

Capitães da areia / Capitaines des sables de Jorge Amado

CAPITÃES DA AREIA

Os Capitães da Areia é um grupo de meninos de rua. O livro é dividido em três partes. Antes delas, no entanto, via uma seqüência de reportagens e depoimentos, explicando que os Capitães da Areia é um grupo de menores abandonados e marginalizados, que aterrorizam Salvador. Os únicos que se relacionam com eles são Padre José Pedro e uma mãe-de-santo, Don'Aninha. O Reformatório é um antro de crueldades, e a polícia os caçam como adultos antes de se tornarem um. A primeira parte em si, "Sob a lua, num velho trapiche abandonado" conta algumas histórias quase independentes sobre alguns dos principais Capitães da Areia (o grupo chegava a quase cem, morando num trapiche abandonado, mas tinha líderes). Pedro Bala, o líder, de longos cabelos loiros e uma cicatriz no rosto, uma espécie de pai para os garotos, mesmo sendo tão jovem quanto os outros, que depois descobre ser filho de um líder sindical morto durante uma greve; Volta Seca, afilhado de Lampião, que tem ódio das autoridades e o desejo de se tornar cangaceiro; Professor, que lê e desenha vorazmente, sendo muito talentoso; Gato, que com seu jeito malandro acaba conquistando uma prostituta, Dalva; Sem- Pernas, o garoto coxo que serve de espião se fingindo de órfão desamparado (e numa das casas que vai é bem acolhido, mas trai a família ainda assim, mesmo sem querer fazê-lo de verdade); João Grande, o "negro bom" como diz Pedro Bala, segundo em comando; Querido- de- Deus, um capoeirista amigo do grupo, que dá algumas aulas de capoeira para Pedro Bala, João Grande e Gato; e Pirulito, que tem grande fervor religioso. O apogeu da primeira parte é dividido em, quando os meninos se envolvem com um carrossel mambembe que chegou na cidade, e exercendo sua meninez; e quando a varíola ataca a cidade, matando um deles, mesmo com Padre José Pedro tentando ajudá-los e se indo contra a lei por isso. A segunda parte, "Noite da Grande Paz, da Grande Paz dos teus olhos", surge uma história de amor quando a menina Dora torna-se a primeira "Capitã da Areia", e mesmo que inicialmente os garotos tentem tomá-la a força, ela se torna como mãe e irmã para todos. (O homossexualismo é comum no grupo, mesmo que em dado momento Pedro Bala tente impedi-lo de continuar, e todos eles costumam "derrubar negrinhas" na orla.) Professor e Pedro bala se apaixonam por ela, e Dora se apaixona por Pedro Bala. Quando Pedro e ela são capturados (ela em pouco tempo passa a roubar como um dos meninos), eles são muito castigados, respectivamente no Reformatório e no Orfanato. Quando escapam, muito enfraquecidos, se amam pela primeira vez na praia e ela morre, marcando o começo do fim para os principais membros do grupo. "Canção da Bahia, Canção da Liberdade", a terceira parte, vai nos mostrando a desintegração dos líderes. Sem-Pernas se mata antes de ser capturado pela polícia que odeia; Professor parte para o Rio de Janeiro para se tornar um pintor de sucesso, entristecido com a morte de Dora; Gato se torna uma malandro de verdade, abandonando eventualmente sua amante Dalva, e passando por ilhéus; Pirulito se torna frade; Padre José Pedro finalmente consegue uma paróquia no interior, e vai para lá ajudar os desgarrados do rebanho do Sertão; Volta Seca se torna um cangaceiro do grupo de Lampião e mata mais de 60 soldados antes de ser capturado e condenado; João Grande torna-se marinheiro; Querido-de-Deus continua sua vida de capoeirista e malandro; Pedro Bala, cada vez mais fascinado com as histórias de seu pai sindicalista, vai se envolvendo com os doqueiros e finalmente os Capitães da Areia ajudam numa greve. Pedro Bala abandona a liderança do grupo, mas antes os transforma numa espécie de grupo de choque. Assim Pedro Bala deixa de ser o líder dos Capitães da Areia e se torna um líder revolucionário comunista.

Este livro foi escrito na primeira fase da carreira de Jorge Amado, e nota-se grandes preocupações sociais. As autoridades e o clero são sempre retratados como opressores (Padre José Pedro é uma exceção mas nem tanto; antes de ser um bom padre foi um operário), cruéis e responsáveis pelos males. Os Capitães da Areia são tachados como heróis no estilo Robin Hood. No geral, as preocupações sociais dominam, mas os problemas existenciais dos garotos os transforma em personagens únicos e corajosos, corajosos Capitães da Areia de Salvador.

Capitaines des sables

Dans un coin abandonné et désert des entrepôts de Bahia, grand port brésilien, vivent en marge de la société de nombreux gamins surnommés les " Capitaines des Sables ". Vêtus de guenilles, sales, quasi affamés, lâchant des jurons et fumant des mégots, ils sont en vérité les maîtres de la ville, ceux qui la connaissent totalement, ceux qui totalement l'aiment, ses poètes. Ils volent, participent à toutes sortes de mauvais coups, et si habilement que la police ne peut jamais les prendre sur le fait. Leur chef s'appelle Pedro Bala. Ses lieutenants sont le Professeur (parce qu'il aime lire), Patte-Molle, le Chat, Sucre-d'Orge, Coude-Sec, etc. Un jeune prêtre, l'abbé José Pedro, s'intéresse à eux, essaie de les ramener dans une voie meilleure. S'il réussit à se faire aimer d'eux, il ne parvient pas à les amender et n'aboutit qu'à se faire très mal voir de ses supérieurs. C'est l'existence mouvementée, dramatique et poétique à la fois, de cette bande de petits chenapans qui unissent la ruse et l'audace des hommes faits à l'innocence et au charme des enfants qu'évoque le roman de Jorge Amado.

Né dans une plantation de cacao autour de Salvador de Bahia, Jorge Amado est lié dès son enfance au monde des travailleurs et des paysans brésiliens. Bahia, la "terre violente", constitue le décor essentiel de Pays du Carnaval en 1931. La même année, le jeune écrivain et journaliste milite très activement au Parti Communiste, alors interdit au Brésil. Son engagement lui a valu une suite d'exils, d'errances et de retours. Emprisonné une douzaine de fois, ses livres furent brûlés et détruits. Contraint à l'exil en Argentine en 1941, il fut pourtant de retour dans son pays en 1945, où il fut élu député communiste. Lorsque le Parti Communiste fut à nouveau interdit, il s'exila encore, se réfugia en France, puis à Prague, pour enfin revenir au Brésil. De fait, Jorge Amado est aussi bien célèbre dans son pays qu'à l'étranger. Son lyrisme engagé transparaît dans nombre de ses livres et notamment dans 'Le Pays sans retour', publié en 1942. L'inauguration d'une fondation portant son nom à Salvador de Bahia en 1987 consacre la pérénnité de son engagement. Le romancier meurt à 1988 ans sans avoir pu terminer son ultime roman.

Jorge Amado (1912-2001) nasceu na Fazenda Auricídia, em Ferradas, município de Itabuna, Bahia, no dia 10 de agosto de 1912. Filho do fazendeiro de cacau, João Amado de Faria e Eulália Leal Amado. Passou a infância na cidade de Ilhéus, onde aprendeu as primeiras letras. Cursou o secundário no Colégio Antônio Vieira em Salvador. Aos 12 anos foge do internato e vai para Itaporanga, em Sergipe, onde morava sua avô. Passou os anos da sua adolescência no meio do povo, tomando conhecimento da vida popular que iria marcar fortemente sua obra de romancista. Começou com 14 anos a participar da vida literária, sendo um dos fundadores da "Academia dos Rebeldes", grupo de jovens que, juntamente com o "Arco e Flecha" e o "Samba", desempenharam importante papel na renovação das letras baianas. Comandados por Pinheiro Viegas, figuraram na Academia dos Rebeldes, além de Jorge Amado, os escritores João Cordeiro, Dias da Costa, Alves Ribeiro, Edison Carneiro, Valter da Silveira, e Clóvis Amorim. Em 1927, com apenas 15 anos, ingressou como repórter no "Diário da Bahia" e também escrevia para a revista "A Luva". Aos dezenove anos publicou seu primeiro romance "O País do Carnaval". Nessa época já estava no Rio de Janeiro, em contato com nomes importantes da literatura. Foi redator chefe da revista carioca "Dom Casmurro", em 1939. Em 1933 lança seu segundo livro "Cacau". Depois vieram vários romances que retratavam o dia a dia da cidade de Salvador, entre eles "Mar Morto", 1936 e "Capitães de Areia", 1937, que retrata a vida de menores delinquentes, sendo na época proibido pela censura do Estado Novo. Jorge Amado foi casado com a escritora Zélia Gattai (1916-2008), que aos 63 anos começou a escrever sua memórias. Teve dois filhos, João Jorge, sociólogo e autor de peças para teatro infantil, e Paloma, psicóloga, casada com o arquiteto Pedro Costa. É irmão do médico neuropediatra Joelson Amado e do escritor James Amado. Participou do movimento da frente popular da Aliança Nacional Libertadora. Foi exilado na Argentina, no Uruguai, em Paris, em Praga e ainda morou em diversos países. Recebeu vários prêmios, títulos honoríficos. Foi membro correspondente da Academia de Ciências e Letras da República Democrática da Alemanha; da Academia das Ciências de Lisboa; da Academia Paulista de Letras; e membro especial da Academia de Letras da Bahia. Foi membro da Academia Brasileira de Letras, ocupando a cadeira de nº 23. Jorge Leal Amado de Faria faleceu no dia 6 de agosto. Seu velório foi realizado no Palácio da Aclamação em Salvador. Foi cremado, a seu pedido, e suas cinzas foram colocadas ao pé de uma mangueira, em sua casa na Bahia.

mercredi 26 juin 2013

Em brève, O sol Morreu Aqui de João Negreiros

On bouscule ses habitudes littéraires, rien n'est simple, l'être humain et ses travers, un roman qui bouscule même sans notre aprobation, d'une grande qualité littéraire, les personnages s'oposent, se superposent, qui est bon, qui est mauvais ? à lire absolument !!! Magnifiquequement brutal et ironique, sans aucun lissage

Lançamento do livro vencedor do Prémio Literário Nacional Dias de Melo, "O Sol Morreu Aqui" de João Negreiros, o qual o júri do prémio constituído por Luiz Fagundes Duarte, Isabel Pires de Lima, Maria de Jesus Maciel, Daniel de Sá e Manuel Tomás declarou vencedor por unanimidade e considerou "...uma obra de inegável valor literário muito superior à maior parte das que se vão publicando em Portugal".

vendredi 21 juin 2013

Je hais les feux rouges par Antonio Lobo Antunes

Extrait du livre des chroniques :

Je hais les feux rouge. En premier lieu parce qu'ils sont toujours rouges quand je suis pressé et verts quand j'ai tout mon temps, sans parler de l'orange qui provoque en moi une indécision horrible : dois-je freiner ou accélérer ? J'accélère, puis je freine, je réaccélère et à peine ai-je freiné de nouveau que déjà une fourgonnette emboutit ma portière, déjà une foule de gens se rassemble dans l'espoir de voir du sang, déjà un type armé d'une clé anglaise sort de la fourgonnette en me traitant de sombre crétin, déjà ma compagnie d'assurances me propose chaleureusement d'en changer pour un concurrent quelconque, déjà me voici privé de voiture pendant une semaine, me voilà déjà au bord du trottoir à faire des signes de naufragé aux taxis, me voilà déjà à payer une fortune pour chaque voyage où je dois par-dessus le marché supporter le ver luisant magique et la Ste Vierge en aluminium sur le tableau de bord, le squelette en plastique pendu au rétroviseur, l'autocollant représentant une demoiselle à chapeau et cheveux longs près de la pancarte "ne pas fumer je suis asthmatique"... La deuxième et principale raison qui m'incite à haïr les feux rouges tient au fait qu'à chaque fois que je m'arrêtes surgissent derrière ma vitre des créatures invraisemblables : vendeurs de journaux, vendeurs de pansements adhésifs, des dames vertueuses avec des boîtes en métal pendues à leur poitrine qui vous collent autoritairement sur le coeur le crabe du Cancer, les gros balèzes de la Ligue pour les aveugles dans le sillage d'un haut-parleur sur le toit d'un tas de ferraille flambant neuf, le citoyen digne à qui on a volé son porte-monnaie et qui a besoin d'acheter son billet de train pour Porto, le tuberculeux avec son certificat à l'appui, toute la caste des infirmes (micocréphales, macrocéphales, boiteux, bossus, bras étiques, mains avec six doigts, mains sans un doigt, mongoliens, dirigeants de partis politiques, etc.), sans compter l'escouade des pompiers volontaires qui ont besoin d'une ambulance, les lauréats de l'Université de Combra, en cape et soutane, qui ont décidé de faire un voyage de fin d'études en Birmanie et les jeunes toxicos qui n'ont pas réussi à voler un seul lecteur de cassettes ce jour-là. Résultat : au premier feu rouge je n'ai déjà plus de monnaie. Au deuxième je me retrouve sans veste. Au troisième sans chaussure. Au cinquième tout nu. Au sixième je donne ma Volkswagen. Au septième j'attends que le feu passe au rouge pour assaillir à mon tour, mêlé à la multitude de pompiers, étudiants, drogués et microcéphales, le premier véhicule qui s'arrête. En moyenne je change cinq fois de vêtements et de voiture avant d'atteindre ma destination, et quand j'arrive, au volant d'un camion TIR, flottant dans un pantalon gigantesque, mes amis se plaignent que je ne suis pas ponctuel.!

Odeio semáforos. Em primeiro lugar porque estão sempre vermelhos quando tenho pressa e verdes quando não tenho nenhuma, sem falar do amarelo que provoca em mim uma indecisão terrível: travo ou acelero? travo ou acele¬ro? travo ou acelero? acelero, depois travo, volto a acelerar e ao travar de novo já me entrou uma furgoneta pela porta, já se juntou uma data de gente na esperança de sangue, já um tipo de chave-inglesa na mão saiu da furgoneta a chamar-me Seu camelo, já a companhia de seguros me propõe calorosamente que a troque por uma rival qualquer, já não tenho carro por uma semana, já me ponho na borda do passeio a fazer sinais de náufrago aos táxis, já pago um dinheirão por cada viagem e ainda por cima tenho de aturar o pirilampo mágico e a Nossa Senhora de alumínio do tablier, o esqueleto de plástico pen¬durado do retrovisor, o autocolante da menina de cabelos compridos e chapéu ao lado do aviso «Não fume que sou asmático», proximidade que me leva a supor que os problemas respiratórios se acentuaram devido a alguma perfídia secreta da menina que não consigo perceber qual seja. A segunda e principal razão que me leva a odiar os semáforos é porque de cada vez que paro me surgem no vidro da janela criaturas inverosímeis: ven¬dedores de jornais, vendedores de pensos rápidos, as senhoras virtuosas com uma caixa de metal ao peito que nos colam autoritariamente sobre o coração o caranguejo do Cancro, os matulões da Liga dos Cegos João de Deus nas vi¬zinhanças de um altifalante sobre uma camioneta com um espadalhão novo em folha em cima, o sujeito digno a quem roubaram a carteira e que precisa de dinheiro para o comboio do Porto, o tuberculoso com o seu atestado comprovativo, toda a casta de aleijões (microcefálicos, macrocefálicos4, coxos, marrecos, estrábicos divergentes e convergentes, bócios6, braços mirrados, mãos com seis dedos, mãos sem dedo nenhum, mongoloides, dirigentes de partidos políticos, etc.) sem contar o grupo de Bombeiros Voluntários que necessita de uma ambulância, os finalistas de Coimbra, de capa e batina, que decidiram fazer uma viagem de fim de curso à Birmânia e a rapaziada da heroína que não conseguiu roubar nenhum leitor de cassetes nesse dia. Resultado: no primeiro semáforo já não tenho trocos. No segundo não tenho casaco. No terceiro não tenho sapatos. No quinto estou nu. No sexto dei o Volkswagen. No sétimo aguardo que a luz passe a encarnado para assaltar por meu turno, de mistura com uma multidão de bombeiros, de estudantes, de drogados e de microcefálicos o primeiro automóvel que aparece. Em média mudo cinco vezes de vestimenta e de carro até chegar ao meu destino, e quando chego, ao volante de um camião TIR, a dançar numas calças enormes, os meus amigos queixam-se de eu não ser pontual.

mercredi 19 juin 2013

Gonçalo M. Tavares

Al Berto

Un des grands poètes portugais du XXe siècle (1948-1997

Né à Coimbra en 1948 dans une famille très conservatrice, exilé en Belgique de 1967 à 1975, Al Berto (alias Alberto Raposo), d’abord étudiant en Arts, choisit en 1971 la voie de l’écriture. Une grande partie de ses œuvres - [À la recherche du vent dans un jardin en août], Salsugem [Varechs], Trois Lettres de la mémoire des Indes, [Calendrier lunaire] - reflètent fortement sa fréquentation de milieux artistiques interlopes, et son errance d’expériences extrêmes en solitude désolée. Apparentée par ses thèmes à la littérature des Beatniks, fortement lyrique et pourtant narrative, sa poésie habitée par des images comme la brûlure, la blessure, le sel ou la rugosité exalte une constante douleur de vivre : Esprits nomades http://www.espritsnomades.com/sitelitterature/Al%20Berto/al-berto.html

Valter Hugo Mãe

Valter Hugo Mãe (Portugal, 1971) est né en Angola et vit actuellement au Portugal. Poète, romancier, essayiste, critique. Il a été éditeur d’une des maisons d’édition de poésie les plus importantes au Portugal, où il a publié plusieurs jeunes poètes. Parmi ses livres récents : pornografia erudita, Edições Cosmorama, 2007; livro de maldições, Objecto Cardíaco, 2006. Son roman o remorso de baltazar serapião, paru chez Quidnovi en 2006, lui a valu le Prix José Saramago. Sur son œuvre, on a publié: A meta física do corpo, sobre a poesia de valter hugo mãe, avec une anthologie, de Rui Lage, Edições Cosmorama, 2006.

nous avons une définition valable de la présence du bétail, une perception singulière qui nous révèle au contenu du jour, le secret de dieu auquel on ne peut échapper

nous lançons le temps contre le corps et menaçons de nous enfermer dans le mutisme

nous existons comme simples émanations des animaux

a capitalização do amor

não escondemos que aprendemos a capitalizar o amor, entregando amplamente os nossos melhores momentos às raparigas mais carentes. o amor, sabemos bem, é o caminho directo para a inutilidade, e nós procuramos as raparigas que mais rapidamente se inutilizem perante as coisas clássicas da vida. não nos queremos atarefar com a vulgaridade, e gostaríamos até de impregnar cada gesto com características alienígenas, mas o tempo escapa-se e o dinheiro também e, se só pensamos no amor, não temos como fazer de outro modo senão vendê-lo entusiasticamente, como fontes de trovões bonitos jorrando nas praças mais movimentadas das cidades. e as raparigas correm para nós urgentes e cheias de vida, férteis de tudo quanto o amor se abate sobre elas, uma alegria rica de se ver, e nós a balançar os braços para chamar a atenção de mais e mais e já nem sabemos como parar, como forças incontroladas, à semelhança de mecanismos ferozes da natureza, e só sairemos daqui quando desfalecermos de amor até pelas raparigas mais feias

poema sobre o amor eterno

inventaram um amor eterno. trouxeram-no em braços para o meio das pessoas e ali ficou, à espera que lhe falassem. mas ninguém entendeu a necessidade de sedução. pouco a pouco, as pessoas voltaram a casa convictas de que seria falso alarme, e o amor eterno tombou no chão. não estava desesperado, nada do que é eterno tem pressa, estava só surpreso. um dia, do outro lado da vida, trouxeram um animal de duzentos metros e mil bocas e, por ocupar muito espaço, o amor eterno deslizou para fora da praça. ficou muito discreto, algo sujo. foi como um louco o viu e acreditou nas suas intenções. carregou-o para dentro do seu coração, fugindo no exacto momento em que o animal de duzentos metros e mil bocas se preparava para o devorar

lundi 17 juin 2013

Lost Scriptum

"Quem foi no domingo passado à Casa De Portugal Andréde Gouveia,naCité Universitaire de Paris, para assistir ao recital-concerto“Lost Scriptum”ficou pelomenos com a certeza que viu um espetáculo único e inédito. “Esta é a segunda vez que acolhemos O Patrick Caseiro na Casa dePortugal, Em dois espaços diferentes”disseAna Paixão, a Diretora da Casa. “Desta vez estamos aqui nesta sala ainda em obras e deixo desde já o convite para uma terceira vez, quando este teatro estiver construído, que espero seja para breve” Em “Lost Scriptum” a voz, o som e a imagem sobrepõem-se, fragilizando a fronteira entre a energia do rock e os murmúrios poéticos. Não se sabe ao certo se é um recital de poesia ou um concerto de rock. “Eu chamar-lhe-ia uma coisa estranha, tipo um híbrido, uma miscelânea entre poesia dita, declamada, com imagens e também com canções, num formato mais clássico da canção” explica Patrick Caseiro ao LusoJornal. O poema é o fio condutor. Aliás, uma frase de Friedrich Nietzsche é várias vezes repetida: “Cada palavra é um preconceito”. “A ideia de ‘Lost Scriptum’ - em vez de ser um ‘Post Scriptum’ - é uma Forma de congelar, de certa forma, escritos que podem estar no fundo das gavetas, perdidos.Vamos então procurar textos de autores por quem nutrimos uma certa admiração, sejam eles lusófonos, francófonos ou até anglófonos. A ideia é pôr em palco os textos destas pessoas. O formato, apetece me dizer que não é o mais importante, mas é sobretudo arranjar um fio condutor” explica Patrick Caseiro. Estavam anunciados poemas de vários autores, desde Fernando Pessoa a Jack Kerouac, passando por Al Berto, Eugénio deAndrade, Nick Cave, Bashung, Valter Hugo Mãe, Charles Baudelaire, Manoel Bandeira, António Topa, Maria Graciete Besse, Charles Bukowski,... e do próprio Patrick Caseiro. “O Miguel Torres é um espanhol que é sedento de literatura portuguesa, ele adora os poetas hispanófonos, mas adora também os autores portugueses, sentiu que há ali uma coisa de muito visceral e profunda, sentiu que há ali uma grande pesquisa e eu quando senti isso, lancei-lhe o desafio. Inicialmente fizemos uma série de espetáculos a dois”.E Miguel Torres lá estava incansável, entre os dois projetores que cuspiam imagens em movimento nas paredes nuas do futuro anfiteatro, ou ajudando nas percussões. Marco de Oliveira, também lá estava, na guitarra e nas programações. “O Marco toca comigo na banda da qual sou uma espécie de mentor, o projeto Pat Kay. Ele já é o guitarrista da banda. Gostou do princípio e é o segundo espetáculo que fazemos a três. A coisa está-se a construir progressivamente diz Patrick Caseiro ao LusoJornal. O trio quer levar o espetáculo a outras salas, a outros espaços. “Cada espetáculo é sempre diferente. O desafio que nos lançámos os três é de cada vez fazer uma coisa inédita. Hoje tínhamos aqui um espaço muito rugoso, as paredes nem estão ainda caiadas nem nada, num anfiteatro faremos uma coisa mais clássica em termos de declamação de textos, embora sempre com música. Vamos personalizando em função do espaço”. No segundo semestre o “Lost Sciptum”deve viajar até Portugal.“Vamos levar este ‘set’, que é um autêntico ‘chantier’,uma empreitada que nunca está acabada, até Portugal. Já temos uma série de datas, desde o norte, até ao Alentejo, passando, claro, pela Capital. E aí sim, vamos trabalhar na língua portuguesa mais do que na francesa ou na inglesa”.

Cada Dia Cada dia é uma pequena vida Uma farpa, uma investida Contra o ar que avança E na esquina nos alcança Cada dia, uma pequena vida Um beco sem saída Vem, lambe-me a ferida! Sou homem-bicho sem guarida Cada dia é uma pequena vida Cada dia é uma pequena ida Um vaivém contra o tempo Maquinal e violento!. . Cada dia, nova romaria: As bocas do metropolitano Cospem rebanhos matinais Mesmas pressas Mesmas preces Mesmos ais! Hoje, vou desmarcar tudo E marcar encontro comigo Ladear o perigo exterior Adiar o grito do pudor Soluços pautam o monólogo Debruço-me sobre o copo Questiono-lhe o fundo Que me apela ao mergulho O marulhar do whisky Que me inebria E me devolve ao passado E eu, por única companhia Deste copo servil e prateado Cada dia é uma pequena vida Cada dia é uma pequena ida Um vaivém contra o tempo Maquinal e violento!. . Caio no regaço da noite. . Exausto, na busca da verdade Deito-me sobre o trânsito Já moribundo da cidade

samedi 8 juin 2013

Fernando Pessoa ao Mário de Sá-Carneiro

Álvaro de Campos

Opiário

Ao Senhor Mário de Sá-Carneiro

É antes do ópio que a minh'alma é doente. Sentir a vida convalesce e estiola E eu vou buscar ao ópio que consola Um Oriente ao oriente do Oriente. Esta vida de bordo há-de matar-me. São dias só de febre na cabeça E, por mais que procure até que adoeça, já não encontro a mola pra adaptar-me. Em paradoxo e incompetência astral Eu vivo a vincos de ouro a minha vida, Onda onde o pundonor é uma descida E os próprios gozos gânglios do meu mal. É por um mecanismo de desastres, Uma engrenagem com volantes falsos, Que passo entre visões de cadafalsos Num jardim onde há flores no ar, sem hastes. Vou cambaleando através do lavor Duma vida-interior de renda e laca. Tenho a impressão de ter em casa a faca Com que foi degolado o Precursor. Ando expiando um crime numa mala, Que um avô meu cometeu por requinte. Tenho os nervos na forca, vinte a vinte, E caí no ópio como numa vala. Ao toque adormecido da morfina Perco-me em transparências latejantes E numa noite cheia de brilhantes, Ergue-se a lua como a minha Sina. Eu, que fui sempre um mau estudante, agora Não faço mais que ver o navio ir Pelo canal de Suez a conduzir A minha vida, cânfora na aurora. Perdi os dias que já aproveitara. Trabalhei para ter só o cansaço Que é hoje em mim uma espécie de braço Que ao meu pescoço me sufoca e ampara. E fui criança como toda a gente. Nasci numa província portuguesa E tenho conhecido gente inglesa Que diz que eu sei inglês perfeitamente. Gostava de ter poemas e novelas Publicados por Plon e no Mercure, Mas é impossível que esta vida dure. Se nesta viagem nem houve procelas! A vida a bordo é uma coisa triste, Embora a gente se divirta às vezes. Falo com alemães, suecos e ingleses E a minha mágoa de viver persiste. Eu acho que não vale a pena ter Ido ao Oriente e visto a índia e a China. A terra é semelhante e pequenina E há só uma maneira de viver. Por isso eu tomo ópio. É um remédio Sou um convalescente do Momento. Moro no rés-do-chão do pensamento E ver passar a Vida faz-me tédio. Fumo. Canso. Ah uma terra aonde, enfim, Muito a leste não fosse o oeste já! Pra que fui visitar a Índia que há Se não há Índia senão a alma em mim? Sou desgraçado por meu morgadio. Os ciganos roubaram minha Sorte. Talvez nem mesmo encontre ao pé da morte Um lugar que me abrigue do meu frio. Eu fingi que estudei engenharia. Vivi na Escócia. Visitei a Irlanda. Meu coração é uma avòzinha que anda Pedindo esmola às portas da Alegria. Não chegues a Port-Said, navio de ferro! Volta à direita, nem eu sei para onde. Passo os dias no smokink-room com o conde - Um escroc francês, conde de fim de enterro. Volto à Europa descontente, e em sortes De vir a ser um poeta sonambólico. Eu sou monárquico mas não católico E gostava de ser as coisas fortes. Gostava de ter crenças e dinheiro, Ser vária gente insípida que vi. Hoje, afinal, não sou senão, aqui, Num navio qualquer um passageiro. Não tenho personalidade alguma. É mais notado que eu esse criado De bordo que tem um belo modo alçado De laird escocês há dias em jejum. Não posso estar em parte alguma. A minha Pátria é onde não estou. Sou doente e fraco. O comissário de bordo é velhaco. Viu-me co'a sueca... e o resto ele adivinha. Um dia faço escândalo cá a bordo, Só para dar que falar de mim aos mais. Não posso com a vida, e acho fatais As iras com que às vezes me debordo. Levo o dia a fumar, a beber coisas, Drogas americanas que entontecem, E eu já tão bêbado sem nada! Dessem Melhor cérebro aos meus nervos como rosas. Escrevo estas linhas. Parece impossível Que mesmo ao ter talento eu mal o sinta! O fato é que esta vida é uma quinta Onde se aborrece uma alma sensível. Os ingleses são feitos pra existir. Não há gente como esta pra estar feita Com a Tranqüilidade. A gente deita Um vintém e sai um deles a sorrir. Pertenço a um gênero de portugueses Que depois de estar a Índia descoberta Ficaram sem trabalho. A morte é certa. Tenho pensado nisto muitas vezes. Leve o diabo a vida e a gente tê-la! Nem leio o livro à minha cabeceira. Enoja-me o Oriente. É uma esteira Que a gente enrola e deixa de ser bela. Caio no ópio por força. Lá querer Que eu leve a limpo uma vida destas Não se pode exigir. Almas honestas Com horas pra dormir e pra comer, Que um raio as parta! E isto afinal é inveja. Porque estes nervos são a minha morte. Não haver um navio que me transporte Para onde eu nada queira que o não veja! Ora! Eu cansava-me o mesmo modo. Qu'ria outro ópio mais forte pra ir de ali Para sonhos que dessem cabo de mim E pregassem comigo nalgum lodo. Febre! Se isto que tenho não é febre, Não sei como é que se tem febre e sente. O fato essencial é que estou doente. Está corrida, amigos, esta lebre. Veio a noite. Tocou já a primeira Corneta, pra vestir para o jantar. Vida social por cima! Isso! E marchar Até que a gente saia pla coleira! Porque isto acaba mal e há-de haver (Olá!) sangue e um revólver lá pró fim Deste desassossego que há em mim E não há forma de se resolver. E quem me olhar, há-de-me achar banal, A mim e à minha vida... Ora! um rapaz... O meu próprio monóculo me faz Pertencer a um tipo universal. Ah quanta alma viverá, que ande metida Assim como eu na Linha, e como eu mística! Quantos sob a casaca característica Não terão como eu o horror à vida? Se ao menos eu por fora fosse tão Interessante como sou por dentro! Vou no Maelstrom, cada vez mais pró centro. Não fazer nada é a minha perdição. Um inútil. Mas é tão justo sê-lo! Pudesse a gente desprezar os outros E, ainda que co'os cotovelos rotos, Ser herói, doido, amaldiçoado ou belo! Tenho vontade de levar as mãos À boca e morder nelas fundo e a mal. Era uma ocupação original E distraía os outros, os tais sãos. O absurdo, como uma flor da tal Índia Que não vim encontrar na Índia, nasce No meu cérebro farto de cansar-se. A minha vida mude-a Deus ou finde-a ... Deixe-me estar aqui, nesta cadeira, Até virem meter-me no caixão. Nasci pra mandarim de condição, Mas falta-me o sossego, o chá e a esteira. Ah que bom que era ir daqui de caída Pra cova por um alçapão de estouro! A vida sabe-me a tabaco louro. Nunca fiz mais do que fumar a vida. E afinal o que quero é fé, é calma, E não ter estas sensações confusas. Deus que acabe com isto! Abra as eclusas — E basta de comédias na minh'alma!

Série Grandes Livros

Maria do Rosário Pedreira .

biografia: Maria do Rosário Pedreira nasceu em Lisboa, em 1959. Licenciou-se em Línguas e Literaturas Modernas, na variante de Estudos Franceses e Ingleses, pela Universidade Clássica de Lisboa (1981). Possui ainda o curso de Língua e Cultura do Instituto Italiano de Cultura em Portugal, tendo sido bolseira do governo italiano e frequentado um curso de verão na Universidade de Perugia. Frequentou durante quatro anos o Goethe Institut, foi professora do Ensino Básico, fez algumas traduções, proferiu conferências, etc. Trabalhou como coordenadora dos serviços editoriais da Editora Gradiva. Foi directora de publicações da Sociedade Portugal-Frankfurt 97 e editora dos catálogos dos pavilhões oficiais temáticos da Expo-98, tal como redactora das publicações inerentes aos Festivais dos 100 Dias e Mergulho no Futuro, promovidos durante a Expo-98. É editora da "Temas e Debates" (grupo Bertelsmann) desde 1998. Como escritora, tem já publicados vários trabalhos de ficção, poesia, ensaio, crónicas e literatura juvenil, procurando neste último género a transmissão de valores humanos e culturais. O seu romance Alguns Homens, Duas Mulheres e Eu está construído em torno de uma identidade perdida, onde solidão e feminino são as peças fundamentais. Também o seu livro de poesia A Casa e o Cheiro dos Livros institui a casa como o lugar feminino que acumula esperas, o cheiro dos livros, os restos do amor, os gatos que aí se resguardam da chuva. Para a Autora – já distinguida com alguns prémios literários – , a casa pode ser considerada como um mundo onde se encerra tudo aquilo que vai perdurando, mesmo que sob a forma da memória, nostalgicamente.

Mãe, eu quero ir-me embora – a vida não é nada daquilo que disseste quando os meus seios começaram a crescer. O amor foi tão parco, a solidão tão grande, murcharam tão depressa as rosas que me deram – se é que me deram flores, já não tenho a certeza, mas tu deves lembrar-te porque disseste que isso ia acontecer. Mãe, eu quero ir-me embora – os meus sonhos estão cheios de pedras e de terra; e, quando fecho os olhos, só vejo uns olhos parados no meu rosto e nada mais que a escuridão por cima. Ainda por cima, matei todos os sonhos que tiveste para mim – tenho a casa vazia, deitei-me com mais homens do que aqueles que amei e o que amei de verdade nunca acordou comigo. Mãe, eu quero ir-me embora – nenhum sorriso abre caminho no meu rosto e os beijos azedam na minha boca. Tu sabes que não gosto de deixar-te sozinha, mas desta vez não chames pelo meu nome, não me peças que fique – as lágrimas impedem-me de caminhar e eu tenho de ir-me embora, tu sabes, a tinta com que escrevo é o sangue de uma ferida que se foi encostando ao meu peito como uma cama se afeiçoa a um corpo que vai vendo crescer. Mãe, eu vou-me embora – esperei a vida inteira por quem nunca me amou e perdi tudo, até o medo de morrer. A esta hora as ruas estão desertas e as janelas convidam à viagem. Para ficar, bastava-me uma voz que me chamasse, mas essa voz, tu sabes, não é a tua – a última canção sobre o meu corpo já foi há muito tempo e desde então os dias foram sempre tão compridos, e o amor tão parco, e a solidão tão grande, e as rosas que disseste um dia que chegariam virão já amanhã, mas desta vez, tu sabes, não as verei murchar. Maria do Rosário Pedreira

Canção de Batalha - Guerra Junqueiro - Declamada por Pedro Abrunhosa

Que durmam, muito embora, os pálidos amantes,

Que andaram contemplando a Lua branca e fria…

Levantai-vos, heróis, e despertai, gigantes!

Já canta pelo azul sereno a cotovia

E já rasga o arado as terras fumegantes…

Entra-nos pelo peito em borbotões joviais

Este sangue de luz que a madrugada entorna!

Poetas, que somos nós? Ferreiros d’arsenais;

E bater, é bater com alma na bigorna

As estrofes de bronze, as lanças e os punhais.

Acendei a fornalha enorme – a Inspiração.

Dai-lhe lenha – A verdade, a Justiça, o Direito –

E harmonia e pureza, e febre, e indignação;

E p’ra que a labareda irrompa, abri o peito

E atirai ao braseiro, ardendo, o coração!

Há-de-nos devorar, talvez, o incêndio; embora!

O poeta é como o sol: o fogo que ele encerra

É quem espalha a luz nessa amplidão sonora…

Queimemo-nos a nós, iluminando a Terra!

Somos lava, e a lava é quem produz a aurora!

Le Poème Continu Herberto Helder

Um poema cresce inseguramente na confusão da carne, sobe ainda sem palavras, só ferocidade e gosto, talvez como sangue ou sombra de sangue pelos canais do ser. Fora existe o mundo. Fora, a esplêndida violência ou os bagos de uva de onde nascem as raízes minúsculas do sol. Fora, os corpos genuínos e inalteráveis do nosso amor, os rios, a grande paz exterior das coisas, as folhas dormindo o silêncio, as sementes à beira do vento, — a hora teatral da posse. E o poema cresce tomando tudo em seu regaço. E já nenhum poder destrói o poema. Insustentável, único, invade as órbitas, a face amorfa das paredes, a miséria dos minutos, a força sustida das coisas, a redonda e livre harmonia do mundo. — Embaixo o instrumento perplexo ignora a espinha do mistério. — E o poema faz-se contra o tempo e a carne.

Incertain grandit un poème dans le désordre de la chair. Il monte sans mots encore, purs plaisir et férocité Peut-être comme du sang Ou ne ombre de sang irriguant l’être Dehors il y a le monde, dehors, la splendide violence Les grains de raisins d’où naissent Les infimes radicelles du soleil Dehors les corps premiers, inaltérables, De notre amour, Des fleuves, la grande paix extérieure des choses, Les feuilles dormante le silence - l’heure théâtrale de la jouissance. Et le poème grandit recueillant tout en son sein Et déjà nul pouvoir n’abolira le poème Insoutenable, unique, Il envahit les maisons reposant dans les nuits, Les lumières, les ténèbres, autour de la table La force soutenue des choses, la pleine et libre harmonie du monde - En bas l’instrument perplexe ignore l’échine du mystère - Et le poème se fait contre le temps et la chair.

Vision de l'être / Visão do ser Pedro Lyra

Pedro Lyra : “Vision de l’être, Visão do Ser” LATITUDES n° 15 - septembre 2002 89 Pedro Lyra* est un poète et essayiste brésilien né le 28.01.1945 à Fortaleza au Brésil. Vision de l’être, Visão do Ser**, est une anthologie poétique, publiée au Brésil en 1999, qui rassemble, en plus de quelques inédits, une sélection de poèmes des cinq derniers livres du poète: Decisão, poemas dialécticos, 1983; Desafio, uma poética do amor, 1991; Contágio, poesia do desejo, 1993; Errância, uma alegoria transhistórica, 1996; Jogo, um delírio erótico-metafísico-económico, 1999. Pedro Lyra est l’auteur de huit textes de poésie et de huit essais. Ce poète appartient à la génération 60, qui s’est révolté contre la dictature militaire, qui a sévi au Brésil dès 1964, et qui défend une idéologie marxiste. Ces deux références sont Brecht et Maïakovski. Pour lui, la poésie est une arme (poème idéologemme) qui peut pousser le lecteur à la révolte en favorisant une prise de conscience et en modifiant les esprits. Mais nul besoin d’avoir connu la dictature militaire pour comprendre ses poèmes, car ils sont étonnamment (et cruellement) actuels. Ils ne parlent pas d’autre chose que de nous-mêmes et de notre monde, de notre société actuelle. Ce sont d’abord des poèmes de dénonciation: la dénonciation d’un système qui broie l’homme et son avenir. Pedro Lyra est un poète socialiste qui défend des idéaux et développe une vision de l’homme et de son destin social. Il confronte avec ironie le rêve: tout ce qui devrait être possible et la réalité, toutes les promesses abandonnées, non tenues de la vie. Il est question dans ses poèmes d’une désillusion, d’un amer constat. Il regarde la poésie de la vie et de la nature, de l’amour écrasé par la réalité sociale et économique: la pauvreté, la faim , l’injustice, la Loi et les privilèges, les enfants qui mendient, les hommes qui fouillent dans les poubelles, les jeunes sans repères, comme autant de promesses, de fleurs qui ne peuvent être cueillies (cf. les poèmes “Chant à un lundi de décembre”, “Dans le parc”, “Paysage”). Il dénonce un système (capitaliste), où le travail au quotidien devient une mécanique qui empêche de vivre, de profiter d’un beau jour, du soleil, du parfums des arbres, des choses simples de la vie dont il fait l’apologie, car ses poèmes sont aussi des poèmes de sagesse, de conseil, proches de la poésie orientale (poèmes, “Chant à un lundi de décembre”, “Un jour”, “Les sonnets de consolation”). Le travail n’est plus qu’un esclavage, car il faut suivre sur le plan matériel, alors que le travail devrait être une construction. Qui ne se reconnaîtra- pas dans ces quelques vers : “Ce que je vois (...) ce sont des hommes qui luttent dans les bureaux - dont ils sortent l’âme hypothéquée. Chez tous, l’incertitude de l’avenir. Et l’ornière du présent.” (poème “Paysage”) Pedro Lyra réécrit, à partir de l’observation du quotidien, une nouvelle genèse, comme une nouvelle Bible: pour offrir sa vision de l’homme et de la vie, pour retracer le sort de l’homme, comme une promesse non tenue. La beauté de la vie opposée à ce à quoi elle finit par se réduire, comment l’homme utilise sa liberté, ou ne l’utilise pas justement, car on l’en empêche. Il réfléchit et il médite, à coups de parenthèses, sur ces entraves qui empêchent l’homme d’être, de profiter pleinement de la vie et de construire son propre monde et sa propre histoire, alors que c’est justement ce pourquoi il est fait, son “projet (Sonnet d’affirmation). Ou comment la réalité sociale peut pervertir le sens naturel de la vie. “Quant aux épines, elles peuvent bien continuer à blesser les fleurs” (poème “Poétique”) * Pedro Lyra est professeur de poétique à l’Université fédérale de Rio de Janeiro et consultant culturel des éditions Topbooks à Rio de Janeiro. * *Pedro Lira : Vision de l’être, Visão do Ser, anthologie poétique, organisation, étude et texte final traduit du portugais (Brésil) par Catherine Dumas, édition bilingue, L’Harmattan/Topbooks, Fundação Cultural de Fortaleza, Rio de Janeiro/Fortaleza/Paris, 2000, 258 p. Pedro Lyra : “Vision de l’être, Visão do Ser” Bárbara de Lacerda

As duas faces

olhe bem citadao, e veja o mondo que construimos para seus filhos Absoluta tranquilidade na ruas Nehuma voz de discordancia Todos num produtivo labor È paz, è ordem, è trabalho E motivo nehum para insatisfaçao - Vejo Paz, ordem, trabalho Seu mundo è seguro como um quartel A vida surgio para o risco de vivé-la Nem as folhas da avores balaçam Mas eu Sonho com um mundo de movimento equilibrado Nao com a anulaçao do movimento ; Mesmo as pedras obedecem : Mas eu quero Um mundo onde os contrarios se harmonizem Nao a iliminaçao dos contrarios Atè as almas suam : Mas eu luto pur um mundo Nao apenas onde o homem realiza atividades Tabem onde as atividadesrealizem o homem Um mundo de paz, de ordem, de trabalho (e de justica, E liberdade E de Prazer Decizao

Les deux visages

Regarde bien citoyen, et vois Le monde que nous construisons pour les enfants : Une tranquillité absolue dans le s rues ; Aucun cri discordant ; Tout le monde au labeur productif C’est la paix. C’est l’ordre. C’est le travail. Aucun motif d’insatisfaction. - Je vois Paix, ordre travail Votre monde est sûr comme une caserne Et la vie a surgi pour le risque de la vivre Les feuilles des arbres ne se balancent même pas : Mais moi Je rêve d’un monde au mouvement équilibré, Pas de l ‘annulation du mouvement ; Même les pierres obéissent : Mais moi je veux Un monde où les contraires s’harmonisent, Pas l’élimination des contraires Même les âmes transpirent : Mais moi je lutte pour un monde Où non seulement l’homme réalise des activités, Mais où les activités réalisent aussi l’homme Un monde De paix, d’ordre, de travail (Et de justice, Et de liberté, Et de plaisir.) Extrait de décision

Antonio Lobo Antunes, et la MC93

En 2011, la MC93 de Bobigny, a consacré tout un semeètre à Antonio Lobo Antunes, à travers divers spectales et lectures mises en scène


Une saison avec ANTONIO LOBO ANTUNES par MC93Bobigny


#2 Bande-annonce Théâtre des livres de Lobo... par MC93Bobigny


Bande-annonce-Théâtre des livres Antonio Lobo... par MC93Bobigny


Lettres de la guerre par MC93Bobigny


Que cavalos.... Genèse du projet par Maria de... par MC93Bobigny


#1 Lobo Antunes rencontre ses lecteurs - 2008 par MC93Bobigny

vendredi 7 juin 2013

Le Soulier de Satin par Manoel de Oliveira

Première journée L’action se déroule à l’époque des grandes découvertes lorsque les caravelles des conquistadores sillonnaient les mers. Le hasard a jeté, à la suite d’un naufrage, le jeune Don Rodrigue de Manacor sur la côte africaine ; le premier visage qui s’est offert à lui lorsqu’il a ouvert les yeux a été celui de Doña Prouhèze, l’épouse de Don Pélage, gouverneur général des Présides. Un amour absolu est né entre les deux jeunes gens. Incapable de résister plus longtemps à la voix de Rodrigue qui l’appelle, Doña Prouhèze profite d’un voyage en Espagne pour faire parvenir à Rodrigue une lettre : elle lui donne rendez-vous dans une auberge, au bord de la mer, en Catalogne. Dans le même temps, Don Camille, un cousin de Don Pélage, aventurier sans foi ni loi, presse la jeune femme de partir avec lui dans la citadelle de Mogador où il doit rejoindre son commandement. Loin de s’émouvoir du refus qu’il essuie, Don Camille, comme s’il avait accès aux secrets de la Destinée, donne rendez-vous à Prouhèze en Afrique. Avant de quitter la maison de son époux, accompagnée du fidèle Don Balthazar chargé par Don Pélage de veiller sur la jeune femme, et de partir rejoindre Rodrigue, Doña Prouhèze, dans le mystère d’une prière, offre à la Vierge son soulier de satin, afin que, dit-elle, si elle s’élance vers le mal, elle le fasse du moins d’un pied boiteux. Et, bien décidée à prendre en défaut l’attention de Don Balthazar, sourde à la voix de son Ange Gardien, Prouhèze, déguisée en homme, court rejoindre celui qu’elle aime. Mais le rendez-vous n’aura pas lieu car, dans la nuit, sur le chemin de Saint Jacques de Compostelle, Rodrigue a été blessé par de faux pèlerins dans le désert de Castille et transporté mourant dans le château de sa mère Doña Honoria. Parallèlement à cette intrigue, Doña Musique, une nièce de Don Pélage, part de son côté, chaperonnée par la noire Jobarbara et guidée par un fantasque Sergent Napolitain, à la rencontre d’un mystérieux vice-roi de Naples. Deuxième journée Doña Prouhèze passera quelque temps près de Rodrigue dans le château de Doña Honoria mais elle s’interdira la chambre du blessé. C’est là que Don Pélage arrive bientôt porteur d’une mission pour la jeune femme : prendre le commandement de Mogador, sur la côte africaine, où Don Camille est soupçonné de jouer un double jeu. Doña Prouhèze part aussitôt sans avoir revu Rodrigue. Lui-même, à peine rétabli, prend la mer dans le sillon du bateau de la jeune femme. Le roi l’a chargé de porter une lettre au nouveau commandeur de Mogador… On découvre alors que le chimérique vice-roi de Naples existe bel et bien ; entouré de ses amis les plus proches, il devise dans la campagne romaine, sur l’art et l’église catholique ! Et très bientôt, il rencontrera Doña Musique rescapée d’un naufrage ; et les jeunes gens passeront leur première nuit au cœur de la forêt vierge sicilienne ! Apparaît, à ce moment-là, saint Jacques, dont la constellation, clef de voûte de l’océan, illumine la nuit de ceux que l’abîme sépare et console les deux amants qui se « fuient à la fois et se poursuivent ». Lorsqu’il arrivera à Mogador, Rodrigue ne sera pas reçu par Doña Prouhèze. Elle n’ouvrira même pas la lettre royale mais écrira au dos, en guise de réponse : « Je reste, partez ». Et elle confie à Don Camille, l’apparent vainqueur du moment, le soin de la rendre avec une ironie cinglante à Rodrigue. Pourtant sur les remparts de Mogador, tandis que l’envoyé du roi regagne ses appartements, une femme tout à coup se met à le précéder et ils s’enlacent dans une étreinte qui n’aura duré qu’une seconde seule. Là-haut dans le ciel, la Lune contemple cette ombre double qui, toute éphémère qu’ait été son existence « fait partie pour toujours des archives indestructibles » ! Troisième journée Doña Musique a suivi son mari, le vice-roi de Naples, à Prague et nous la retrouvons, enceinte du futur Jean d’Autriche et entourée de quatre saints, en train de prier pour la paix au cœur de l’Europe, dans l’église Saint Nicolas du quartier de la Mala Strana. Doña Prouhèze, de son côté, devenue veuve de Don Pélage, abandonne son corps à Don Camille en l’épousant pour des raisons stratégiques de pouvoir. Don Rodrigue, désormais vice-roi des Indes occidentales, mène dans son palais délabré de Panama une vie amère, entouré d’une cour sans faste ni gaieté. Sa maîtresse, Doña Isabel complote pour écarter cet amant qui ne l’aime pas et voir passer le pouvoir dans les mains de son matri Don Ramire. Seule à la tête de la forteresse de Mogador, Prouhèze, dans la détresse d’un jour de trop grande souffrance, envoie une lettre à Rodrigue dans laquelle elle lui demande de la délivrer de Don Camille. Cette « lettre à Rodrigue » va devenir une véritable légende sur les mers entre le vieux et le nouveau monde. Portant malheur à tous ceux qui la touchent, elle va mettre dix ans, passant d’un continent à l’autre, avant de parvenir entre les mains de son destinataire et coûter la vie au passage à Don Leopold Auguste, le vieil universitaire réactionnaire amoureux de la grammaire. C’est cette lettre qui va servir d’arme à Doña Isabel pour écarter Rodrigue de Panama car aussitôt Rodrigue part pour Mogador afin de délivrer Prouhèze. En réalité, la délivrance de Prouhèze, son Ange Gardien vient le lui annoncer dans la nuit, ce sera la mort. Lorsqu’elle monte à bord de la caravelle de Rodrigue, ce n’est donc pas pour partir avec lui mais pour confier à Rodrigue Marie des Sept-Épées, la fille qu’elle a eu de Camille. Quant à elle, elle retourne à terre où tout est prêt pour qu’à minuit saute le citadelle de Mogador. Dans la mort, Prouhèze deviendra « une étoile éternelle » pour Rodrigue. Quatrième journée Toute la quatrième « journée » du Soulier de satin se déroule quelque dix années plus tard sur la mer, à large des îles Baléares, et nous fait découvrir tout un monde de pêcheurs, de matelots, de conquistadors épuisés, de courtisans aussi ridicules qu’obséquieux. Frappé de disgrâce pour avoir abandonné l’Amérique, Don Rodrigue, vieilli, ayant perdu une jambe en combattant les Japonais, gagne sa vie en peignant des « feuilles de saints », grossières images pieuses vendues aux matelots qu’il croise. Doña Sept-Épées, sa fille spirituelle, essaie de réveiller l’esprit d’aventure du vieux conquistador et l’entraîner avec elle ainsi que sa fidèle amie, la Bouchère, à l’assaut des places fortes de Barbarie pour délivrer les chrétiens des bagnes d’Afrique du nord. Mais Rodrigue est bien davantage sensible à une autre voix féminine, celle d’une fausse Marie Stuart, une comédienne envoyée par le Roi d’Espagne qui rêve d’humilier Rodrigue dont le vieux rafiot offusque sur la mer la majesté de la cour flottante. Elle a pour mission de l’engager à venir gouverner avec elle l’Angleterre alors même que l’Espagne vient de voir tous ses rêves de gloire et de puissance anéantis par la terrible défaite de l’Invincible Armada. Convoqué devant le Roi, Rodrigue s’enflamme imprudemment en de grands et généreux projets. Il est aussitôt arrêté pour haute trahison et vendu comme esclave. C’est une vieille sœur glaneuse qui le prendra avec une brassée de vieux vêtements et d’objets hétéroclites, vieux drapeaux et pots cassés, au moment même où l’on entend des trompettes et un coup de canon dans le lointain qui annonce que Marie des Sept-Épées vient d’atteindre le bateau de celui qu’elle aime, Jean d’Autriche, le futur vainqueur de Lépante.

Lautreamont par Bartabas et Mao Morta

Les Chants de Maldoror

Comte de Lautréamont

Chant I, version de 1868 [1]

CHANT PREMIER

Plût au ciel que le lecteur, enhardi et devenu momentanément féroce comme ce qu'il lit, trouve, sans se désorienter, son chemin abrupt et sauvage à travers les marécages désolés de ces pages sombres et pleines de poison ; car à moins qu'il n'apporte dans sa lecture une logique rigoureuse et une tension d'esprit égale au moins à sa défiance, les émanations mortelles de ce livre imbiberont son âme comme l'eau le sucre. Il n'est pas bon que tout le monde lise les pages qui vont suivre ; quelques-uns seuls savoureront ce fruit amer sans danger. Par conséquent, âme timide, avant de pénétrer plus loin dans de pareilles landes inexplorées, dirige tes talons en arrière et non en avant. Écoute bien ce que je te dis : Dirige tes talons en arrière et non en avant, comme les yeux d'un fils qui se détourne respectueusement de la contemplation auguste de la face maternelle ; ou plutôt comme un angle à perte de vue de grues frileuses méditant beaucoup, qui, pendant l'hiver, vole puissamment à travers le silence, toutes voiles tendues, vers un point déterminé de l'horizon d'où tout à coup part un vent étrange et fort, précurseur de la tempête. La grue la plus vieille et qui forme à elle seule l'avant-garde, voyant cela, branle la tête comme une personne raisonnable, conséquemment son bec aussi qu'elle fait claquer, et n'est pas contente (moi non plus, je ne le serais pas à sa place), tandis que son vieux cou, dégarni de plumes et contemporain de trois générations de grues, se remue en ondulations irritées qui présagent l'orage qui s'approche de plus en plus. Après avoir de sang-froid regardé plusieurs fois de tous les côtés avec des yeux qui renferment l'expérience, prudemment, la première (car c'est elle qui a le privilége de montrer les plumes de sa queue aux autres grues inférieures en intelligence), avec son cri vigilant de mélancolique sentinelle, pour repousser l'ennemi commun, elle vire avec flexibilité la pointe de la figure géométrique (c'est peut-être un triangle, mais on ne voit pas le troisième côté que forment dans l'espace ces curieux oiseaux de passage), soit à babord, soit à tribord, comme un habile capitaine ; et, manœuvrant avec des ailes qui ne paraissent pas plus grandes que celles d'un moineau, parce qu'elle n'est pas bête, elle prend ainsi un autre chemin philosophique et plus sûr.

Lecteur, c'est peut-être la haine que tu veux que j'invoque dans le commencement de cet ouvrage ? Qui te dit que tu n'en renifleras pas, baigné dans d'innombrables voluptés, tant que tu voudras, avec tes narines orgueilleuses, larges et maigres, en te renversant de ventre, pareil à un requin, dans l'air beau et noir, comme si tu comprenais l'importance de cet acte et l'importance non moindre de ton appétit légitime, lentement et majestueusement, les rouges émanations ? Je t'assure, elles réjouiront les deux trous informes de ton museau hideux, ô monstre, si toutefois tu t'appliques auparavant à respirer trois mille fois de suite la conscience maudite de l'Éternel ! Tes narines qui seront démesurément dilatées de contentement ineffable, d'extase immobile, ne demanderont pas quelque chose de meilleur à l'espace devenu embaumé comme de parfums et d'encens, car elles seront rassasiées d'un bonheur complet, comme les anges qui habitent dans la magnificence et la paix des agréables cieux.

J'établirai dans quelques lignes comment Maldoror fut bon pendant ses premières années, où il vécut heureux ; c'est fait. Il s'aperçut ensuite qu'il était méchant : fatalité extraordinaire ! Il cacha son caractère tant qu'il put pendant un grand nombre d'années ; mais à la fin, à cause de cette concentration qui ne lui était pas naturelle, chaque jour le sang lui montait à la tête, jusqu'à ce que, ne pouvant plus supporter une pareille vie, il se jeta résolûment dans la carrière du mal… ; atmosphère douce ! Qui l'aurait dit ? lorsqu'il embrassait un petit enfant, au visage rose, il aurait voulu lui enlever ses joues avec un rasoir, et il l'aurait fait très-souvent, si Justice, avec son long cortége de châtiments, ne l'en eût chaque fois empêché, Il n'était pas menteur, il avouait la vérité et disait qu'il était cruel. Humains, avez-vous entendu ? il ose le redire avec cette plume qui tremble. Ainsi donc il est une puissance plus forte que la volonté ! Malédiction ! La pierre voudrait se soustraire aux lois de la pesanteur ! Impossible. Impossible, si le mal voulait s'allier avec le bien ! C'est ce que je disais plus haut.

Il y en a qui écrivent pour rechercher les applaudissements humains au moyen de nobles qualités du cœur que l'imagination invente ou qu'ils peuvent avoir. Moi je fais servir mon génie à peindre les délices de la cruauté, délices non passagères, artificielles, mais qui ont commencé avec l'homme, finiront avec lui. Le génie ne peut-il pas s'allier avec la cruauté dans les résolutions secrètes de la Providence ? ou, parce qu'on est cruel, ne peut-on pas avoir du génie ? On en verra la preuve dans mes paroles ; il ne tient qu'à vous de m'écouter, si vous le voulez bien… ; Pardon, il me semblait que mes cheveux s'étaient dressés sur ma tête ; mais ce n'est rien, car avec ma main je suis parvenu facilement à les remettre dans leur première position. Celui qui chante ne prétend pas que ses cavatines soient une chose inconnue ; au contraire il se loue de ce que les pensées hautaines et méchantes de Maldoror soient dans tous les hommes :

La Princesse de Clèves par Manoel de Oliveira

La Princesse de Clèves de Mme de La Fayette : La Princesse de Clèves est composée en 4 parties Première partie L'action se déroule, en 1558, à la cour du roi Henri II durant les dernières années de son règne. Autour du roi, princes et princesses rivalisent d'élégance et de galanterie. Mlle de Chartres, jeune orpheline de seize ans, élevée par sa mère selon de rigoureuses règles de morale, parait pour la première fois au Louvre. Le prince de Clèves, honnête homme d'une grande droiture morale, tombe amoureux d'elle dès qu'il l'aperçoit. Ebloui par sa beauté, il la demande en mariage. Mlle de Chartres n'a aucune expérience de l'amour et l'épouse sans être amoureuse de lui. Alors qu'elle est mariée, Mme de Clèves rencontre, à la cour, le duc de Nemours. Naît entre eux un amour immédiat et partagé. Mme de Chartres découvre cette passion naissante et met en garde sa fille du danger de ce désir illégitime. Avant de mourir, Mme de Chartres conjure sa fille de lutter contre l'amour coupable que lui inspire le duc de Nemours . Ayant perdu le soutien de sa mère, et afin d'éviter M. de Nemours, qu'elle ne peut s'empêcher d'estimer, Mme de Clèves décide de se retirer à la campagne. M. de Clèves reste à Paris, car il doit consoler l'un de ses amis, M. de Sancerre. Seconde partie Mme de Clèves vit en sa maison de Coulommiers. Elle apprend la mort de Mme de Tournon et est attristée de la disparition de cette jeune femme qu'elle trouvait belle et vertueuse. De retour de Paris, M. de Clèves lui apprend que son ami Sancerre était amoureux depuis près de deux ans de Mme de Tournon et que cette dernière lui avait secrètement promis ainsi qu'à M. d'Estouville de les épouser . C'est seulement le jour de sa mort que M. de Sancerre apprend la perfidie. Le même jour, il connait une douleur immense en apprenant la mort de sa bien-aimée et en découvrant les lettres passionnées que cette dernière a adressées à M. d'Estouville. La princesse de Clèves est troublée par les propos que son mari a tenu a son ami Sancerre et qu'il lui répète : " La sincérité me touche d'une telle sorte que je crois que si ma maîtresse et même ma femme, m'avouait que quelqu'un lui plût, j'en serais affligé sans en être aigri." A la demande de M. de Clèves, Mme de Clèves rentre à Paris . Elle ne tarde pas à se rendre compte qu'elle n'est pas guérie de l'amour qu'elle éprouve pour le duc de Nemours. Elle est en effet émue et pleine de tendresse pour cet homme, qui par amour pour elle, renonce aux espérances d'une couronne. Si elle ne parvient pas à maîtriser ses sentiments, elle est bien décidée à tout faire pour maîtriser ses actes. Elle souhaite à nouveau fuir celui qu'elle aime, mais son mari lui intime l'ordre de ne changer en rien sa conduite. Puis Nemours dérobe sous ses yeux son portrait. Elle se tait, craignant à la fois de dévoiler publiquement la passion que ce prince éprouve pour elle et d'avoir à affronter une déclaration enflammée de cet amoureux passionné. Nemours qui s'est aperçu que la princesse de Clèves avait assisté à ce vol et n'avait pas réagi, rentre chez lui, savourant le bonheur de se savoir aimé. Lors d'un tournoi, Nemours est blessé. Le regard que lui adresse alors Mme de Clèves est la preuve d'une ardente passion. Puis une lettre de femme égarée et dont elle entre en possession laisse supposer que Nemours a une liaison . Elle découvre alors la jalousie. Troisième partie Le Vidame de Chartres, oncle de la princesse de Clèves et ami intime de M. de Nemours est lui aussi très contrarié par cette lettre. Car la lettre qu'a lue la princesse de Clèves et qu'elle croyait adressée à Nemours, d'où sa jalousie, lui appartenait. Et le fait qu'elle circule entre toutes les mains de la Cour le contrarie énormément. En effet cette lettre risque de déshonorer une femme extrêmement respectable et de lui valoir, à lui, Vidame de Chartres, la colère de la Reine qui en a fait son confident et qui n'accepterait pas cette aventure sentimentale. Le Vidame de Chartres souhaite que le duc de Nemours indique être le destinataire de cette lettre et aille la réclamer à la reine dauphine qui l'a maintenant entre les mains. Il lui donne pour cela un billet sur lequel figure son nom , qu'une amie de sa maîtresse lui a donné, et qui permettra à Nemours de se justifier auprès de celle qu'il aime. M. de Nemours rend visite à Mme de Clèves et lui apprend la demande au Vidame de Chartres. Il parvient également grâce au billet que lui a donné son ami à lui prouver qu'il n'est pas compromis dans cette aventure sentimentale. Il parvient ainsi à dissiper la jalousie de la Princesse. En présence de M. de Clèves, les deux amants, pour satisfaire une demande royale, réécrivent de mémoire une copie de la lettre qui a semé le trouble. Mme de Clèves goûte le plaisir de ce moment d'intimité , mais reprend conscience de la passion qu'elle ressent, malgré elle, pour cet homme. Elle décide de repartir à la campagne, malgré les reproches de son mari, qui ne comprend guère son goût pour la solitude. Elle avoue alors, les yeux remplis de larme, qu'elle est éprise d'un autre homme, et que pour rester digne de lui, elle doit quitter la cour. M. de Nemours assiste, caché et invisible, à cet aveu. M. de Clèves est dans un premier temps tranquillisé par la franchise courageuse de son épouse. Puis aussitôt , il commence à ressentir une vive jalousie et presse son épouse de mille questions auxquelles elle ne répond pas. Elle ne lui dévoilera pas le nom de son rival. M. de Nemours, assistant dans l'ombre à cette scène, reste lui aussi dans l'expectative. Le roi demande alors à M. de Clèves de rentrer à Paris. Restée seule , Mme de Clèves est effrayée de sa confession, mais se rassure , en estimant qu'elle a ainsi témoigné sa fidélité à son mari. M. de Nemours s'est enfui dans la forêt et se rend compte que cet aveu lui enlève tout espoir de conquérir celle qu'il aime. Il éprouve pourtant une certaine fierté d'aimer et d'être aimé d'une femme si noble . Il commet surtout l'imprudence de raconter au Vidame de Chartres, l'histoire qu'il vient de vivre. Il a beau raconter cette histoire en termes très vagues, son compagnon devine que cette histoire est la sienne. Clèves apprend de son côté que celui que sa femme n'a pas voulu nommer, n'est autre que M. de Nemours. Puis en raison de l'imprudence de Nemours, l'information de vient publique. Ne sachant que ce dernier a été témoin de cet aveu, M et Mme de Clèves se déchirent en se soupçonnant l'un l'autre d'avoir trahi le secret de leur discussion. Nemours et M et Mme de Clèves que la fatalité a jeté les uns contre les autres sont alors soumis aux soupçons, remords, reproches et aux plus cruels des troubles de la passion. Le roi, lui , meurt, lors d'un tournoi. Quatrième partie Alors que la Cour se rend à Reims pour le sacre du nouveau roi, Mme de Clèves se retire à nouveau à la campagne, cherchant dans la solitude l'impossible tranquillité. Nemours la suit , épié par un espion que Clèves a dépêché sur place. De nuit, Nemours observe la princesse de Clèves alors qu'elle contemple d'un air rêveur un tableau le représentant. Il est fou de bonheur. Encouragé par cette marque d'amour, Nemours se décide à rejoindre celle qu'il aime. Il avance de quelques pas et fait du bruit. Pensant le reconnaître, la princesse se réfugie immédiatement dans un autre endroit du château. Nemours attend en vain dans le jardin , et au petit matin, il se rend dans le village voisin pour y attendre la nuit suivante. La présence du duc de Nemours auprès de la princesse a été racontée à Clèves par son espion. Sans même laisser le temps à son interlocuteur de lui donner plus de précisions, Clèves est persuadé qu'il a été trahi. Il meurt de chagrin, non sans avoir fait "à la vertueuse infidèle d'inoubliables adieux" et l'avoir accablée de reproches. La douleur prive la princesse de toute raison . Elle éprouve pour elle-même et M. de Nemours un véritable effroi. Elle refuse de voir M. de Nemours, repensant continuellement à la crainte de son défunt mari de la voir épouser M. de Nemours. Le Vidame de Chartres réussit tout de même à organiser une entrevue secrète entre les deux amants. Elle le regarde avec douceur , mais lui conseille de rechercher ailleurs une destinée plus heureuse. Puis elle sort sans que Nemours puisse la retenir. La princesse tentera d'apaiser sa douleur en s'exilant dans les Pyrénées. Elle mourra quelques années plus tard en succombant à une maladie de langueur.

Madame Bovary Par Manoel de Oliveira

MAdame Bovary, par Gustave Flaubert: Emma Rouault est la fille du riche fermier M. Rouault. Elle est élevée dans un couvent. Elle rêve d'une vie mondaine comme les princesses des romans à l'eau de rose dans lesquelles elle se réfugie pour rompre l'ennui. Elle devient l'épouse de Charles Bovary, qui malgré de laborieuses études de médecine est un simple officier de santé qui pratique son métier de manière illégale[réf. nécessaire] sans le savoir. Emma est déçue de cette vie monotone. Une invitation au bal du marquis d'Andervilliers lui redonne la joie de vivre. Lorsqu’Emma attend un enfant, son mari décide de quitter la ville de Tostes et s'installer à Yonville-l'Abbaye. Emma fait la connaissance des personnalités locales : le pharmacien progressiste et athée M. Homais ; le curé Bournisien ; Léon Dupuis, clerc du notaire M. Guillaumin ; le noble libertin Rodolphe Boulanger. Emma est déçue par la naissance de la petite Berthe, puisqu’elle aurait préféré mettre au monde un garçon. Elle s'enlise dans l'ennui, et perd tout espoir d'une vie meilleure. Elle n'éprouve plus aucun amour pour Charles, qui pourtant ne lui veut que du bien. Elle ne parvient pas non plus à apprécier sa fille, qu'elle trouve laide et qu'elle confie à Madame Rollet. Elle laisse libre cours à ses dépenses luxueuses chez son marchand d'étoffes, M. Lheureux. Elle repousse les avances de Rodolphe, et de Léon puis elle finit par céder. Ses amants sont vite lassés du sentimentalisme exacerbé de la jeune femme qui rêve de voyages et de vie trépidante. Emma accumule une dette envers M. Lheureux, qui exige d'être remboursé. Les amants d'Emma ont refusé de lui prêter de l'argent. Emma se suicide par désespoir. Charles de son côté, meurt de chagrin.

Pereira Prétend Antonio Tabucchi

" Pereira prétend qu'il y avait trois hommes habillés en civil, et qu'ils étaient armés de pistolets. Le premier qui entra était un petit maigrichon avec de fines moustaches et une barbiche couleur châtain. Police politique, dit le petit maigrichon avec l'air de celui qui commandait, nous devons perquisitionner l'appartement, nous recherchons une personne. Faites-moi voir votre carte d'identification, s'opposa Pereira. L'un des deux autres pointa son pistolet vers la bouche de Pereira et susurra : ça te suffit comme identification, gros lard ? " Lisbonne 1938. Sur fond de salazarisme portugais, de fascisme italien et de guerre civile espagnole, un journaliste portugais solitaire voit sa vie bouleversée. Devenue une oeuvre emblématique de la résistance au totalitarisme et à la censure, Pereira prétend raconte la prise de conscience d'un homme confronté à la dictature.

Antonio Tabucchi est né à Vecchiano près de Pise le jour des premiers bombardements américains sur la ville. Il est fils unique d’un marchand de chevaux. Durant ses années d'études, il voyage en Europe pour étudier la littérature. C'est à Paris qu'il découvre Fernando Pessoa en lisant la traduction française du Bureau de tabac. Son enthousiasme l’amènera à découvrir la langue et la culture du Portugal, pays qui deviendra sa deuxième patrie. Il poursuit des études de littérature portugaise à l’université de Sienne et rédige une thèse sur le Surréalisme au Portugal. Passionné par l’œuvre de Pessoa, il l'a traduite dans son intégralité en italien, avec sa femme, Marie-José de Lancastre, rencontrée au Portugal. De 1987 à 1990, Antonio Tabucchi dirige l’Institut culturel italien à Lisbonne. La ville servira de cadre à plusieurs de ses romans. Il partage sa vie entre Lisbonne, Pise, Florence, voire Paris, et continue d’enseigner la littérature portugaise à l’université de Sienne. Il a beaucoup voyagé de par le monde (Brésil, Inde…). Ses livres sont traduits dans une vingtaine de langues. Plusieurs de ses livres ont été adaptés au cinéma (Nocturne indien, par Alain Corneau), ou au théâtre (Le Jeu de l'envers, par Daniel Zerki). Antonio Tabucchi est chroniqueur en Italie pour le Corriere della Sera et en Espagne pour El País. Il a reçu, entre autres distinctions littéraires, le prix Médicis de la meilleure œuvre étrangère en 1987, le prix Jean Monnet en 1995, le prix Nossack de l’Académie Leibniz en 1999 et le prix France Culture en 2002. Au cours de la campagne électorale italienne de 1995, le protagoniste de son roman Pereira prétend est devenu un symbole pour l’opposition de gauche à Silvio Berlusconi, le magnat italien de la presse. Antonio Tabucchi lui-même a été très engagé contre le gouvernement Berlusconi. En tant que membre fondateur du Parlement international des écrivains, il a pris la défense de nombreux écrivains, notamment son compatriote Adriano Sofri. En juin 2004, il figurait sur la liste du Bloc de gauche, petite formation de la gauche alternative portugaise, lors des élections européennes. Il est l'auteur notamment de Nocturne indien (prix Médicis étranger 1987), de Pereira prétend (Sostiene Pereira) et de la Tête perdue de Damasceno Monteiro. Il a écrit directement en portugais Requiem. Tabucchi succombe à un cancer le 25 mars 2012 à l'Hôpital de la Croix Rouge à Lisbonne, à l'âge de 68 ans. .

Requiem antonio Tabucchi

Dans une maison de campagne de l'Alentejo, un homme assoupi sous un arbre est gagné par une longue hallucination qui va le transporter à Lisbonne et ses environs pendant douze heures, de midi à minuit. C'est un dimanche torride, le dernier de juillet. Dès lors, les personnages du présent croisent les fantômes du passé, les morts et les vivants dialoguent entre eux, le rêve et la réalité se confondent, dans une longue errance à travers Lisbonne qui tient autant du hasard que de la nécessité, jusqu'au repas nocturne dans un restaurant postmoderne avec un Commandeur qui pourrait bien être Fernando Pessoa.

Morreste-te me, de José Luis Peixoto

Regressei hoje a esta terra agora cruel. A nossa terra, pai. E tudo como se continuasse. Diante de mim, as ruas varridas, o sol enegrecido de luz a limpar as casas, a branquear a cal; e o tempo entristecido, o tempo parado, o tempo entristecido e muito mais triste do que quando os teus olhos, claros de névoa e maresia distante fresca, engoliam esta luz agora cruel, quando os teus olhos falavam alto e o mundo não queria ser mais que existir. E, no entanto, tudo como se continuasse. O silêncio fluvial, a vida cruel por ser vida. Como no hospital. Dizia nunca esquecerei, e hoje lembro-me. Rostos tornados desconhecidos, desfigurados na minha certeza de perder-te, no meu desespero desespero. Como no hospital. Não acredito que possas ter esquecido. Enquanto esperava pela minha mãe e pela minha irmã, as pessoas passavam por mim como se a dor que me enchia não fosse oceânica e não as abarcasse também. As mulheres falavam, os homens fumavam cigarros. Como eu, esperavam; não a morte, que nós, seres incautos, fechamos-lhe sempre os olhos na esperança pálida de que, se não a virmos, ela não nos verá. Esperavam. Num carro demasiado rápido, a minha mãe, curvada de perder o que possuía, e a minha irmã. Os homens e as mulheres falavam e fumavam ainda quando subimos. No quarto, numa cama qualquer que não a tua, o teu corpo, pai. Talvez distante, preso num olhar entreaberto e amarelado, respiravas ofegante. O ar com que lutavas, lutavas sempre, gritava o seu caminho rouco. Pelo nariz, entrava o tubo que te sustinha. Aos pés da cama, a minha mãe calada, viúva de tudo. À cabeceira, a minha irmã, eu. Cortinas de plástico, biombos de banheira separavam-nos das outras camas. Pousei-te as mãos nos ombros fracos. Toda a força te esmorecera nos braços, na pele ainda pele viva. E menti-te. Disse aquilo em que não acreditava. Ao olhar amarelo, ofegante, disse que tudo serias e seríamos de novo. E menti-te. Disse vamos voltar para casa, pai; vamos que eu guio a carrinha, pai; só enquanto não puder, pai; vá, agora está fraco mas depois, pai, depois, pai. Menti-te. E tu, sincero, a dizeres apenas um olhar suplicante, um olhar para eu nunca mais esquecer. Pai. À hora, mandaram-nos sair. Quando saímos, agarrados como naúfragos, a luz abundante bebia-nos. 1/4 José Luís Peixoto morreste-me (Edições portuguesas: 1ª edição - Maio de 2000, edição de autor; 3ª edição - Fev. 2002, Temas e Debates) E esta tarde, e esta terra agora cruel. Na nossa rua, a nossa casa. A porta do quintal parada à minha frente, fechada, desafiante. Dizia nunca esquecerei, e esta tarde lembrei-me. Com os teus movimentos, tirei do bolso o teu molho de chaves e, como costumavas, usei todos os cuidados para escolher a chave certa, examinando cada uma, orgulhando-me de cada uma. E, na fechadura, o triunfo. As coisas a acontecerem devidamente. A ferrugem, as dobradiças soltaram um grito como um suspiro ou um estertor. O alumínio rente ao mármore arrastou, varreu uma figura certa e branca no cobertor grosso de folhas de pessegueiro. Abandonado sobre o tamanho grande de um inverno, o quintal de quando eu era pequeno, o quintal que construíste, pai. Tristes tristes flores novas e folhas novas nos ramos das árvores, canteiros pintados de malvas, trevos, ervas verdes, verdes de quando eu era pequeno e tu chegavas e me ensinavas trabalhos de grande. Orienta-te, rapaz. Eu oriento-me, pai. Não se preocupe. Eu também sei, eu também consigo. Eu oriento-me, pai. não se rale. O trabalho não me mete medo. Esteja descansado, pai. Flores novas e folhas novas nos ramos das árvores, canteiros pintados de malvas, trevos, ervas verdes, verdes desta primavera triste triste. Se pudesse tinha-te protegido. Chamavas-me pelo nome, chamavas-me filho, e ouvir o meu nome na tua voz, e ouvir filho no fio cálido da tua voz era uma emoção funda. Se pudesse tinha-te protegido. A esperança, pai. De três em três semanas, cinco manhãs seguidas viam-te ir ao tratamento; eu, teu filho, via-te ir ao tratamento e doía-me a vida, doía-me a vida que em ti se negava, a vida a gastar-te, ainda que a amasses, a vida a derrubar-te, ainda que a amasses. O tratamento. Falavas nele, dizias a palavra, dizias vou ao tratamento e nós que sabíamos, enchíamo-nos de uma amargura indelével, definitivamente marcada vincada na nossa pele interior. Por tua vontade, nunca te atrasavas. Dizias vou ao tratamento, apressavas-me, apressavas a minha mãe, como se alguma coisa te pudesse curar, como se alguma coisa te pudesse devolver os dias. No hospital, a sala de espera estagnada de tempo inútil e a minha mãe sentada, só, longe da nossa casa e dos nossos sítios, como uma menina tímida, envergonhada. Tu a afastares-te, como o rapaz tratador de vida que sempre quiseste que eu fosse, a 2/4 José Luís Peixoto morreste-me afastares-te, vestido com a camisa mais nova e as calças mais novas e a camisola que a minha irmã te deu pelos anos, a afastares-te, pelos corredores carregados de cinzento e acesos de electricidade baça, a afastares-te, e a sensação terrível de nunca mais voltares. Entrei em casa. Apenas a lareira fria, as janelas fechadas a moldarem sombras finas no escuro. Do silêncio, da penumbra, um crescer de espectros, memórias? não, vultos que se recusavam a ser memórias, ou talvez uma mistura de carne e luz ou sombra. E vi-te pensei-te lembrei-te, à mesa, sentado no teu lugar. Ainda sentado no teu lugar, e eu, a minha mãe, a minha irmã, sentados também, a rodearmos-te. Iguais ao que éramos. Ali estávamos há muito tempo, esquecidos abandonados desde um dia em que o passar das coisas parou na nossa felicidade simples singela. Como uma alegria, como se tivéssemos jantado ou esperássemos jantar ou o melhor banquete, estávamos. Felizes. Nada me era dito, mas eu, olhando, sabia tudo, como se fosse óbvio, como se não pudesse ser de outra maneira. Tu, de certeza, tinhas chegado do trabalho, e tinha sido um bom dia, e estavas contente por isso, e as pessoas não faltavam com o pagamento e isso era bom. A minha irmã andava no liceu, e as notas eram só satisfazes muitos e bastantes, e ainda era esperta, e sorria por isso. Eu andava no primeiro ano da telescola, e não pensava nas notas, e tinha jogado à bola, e tinha ganho, e se tivesse perdido era igual. A minha mãe, mãe verdadeira de todos nós, olhava-nos e sorria assim e sorria por isso. Felizes. Distantes da chuva grossa deste inverno negro, distantes do teu corpo gelado. Lívido na luz trémula das velas, arranjadinho, penteado com água, vestido com o fato que usaste no casamento da minha irmã: o teu corpo gelado. E a Capela de São Pedro cheia de gente a abraçar-me, cheia de gente a dizer-me coitadinho e os meus pêsames e sinto muito, cheia de gente a procurar-me e a querer agarrar-me e prender-me e dizer coitadinho e os meus pêsames e sinto muito. Pai. Perder-te. E revivi o silêncio insepulto dos teus lábios mortos. E as sombras de nós, como se apenas esperassem estes pensamentos para se perderem, misturaram-se no preto. O pó das horas sem gente a vivê-las cobriu os móveis e o espaço fechado entre eles. 3/4 José Luís Peixoto morreste-me 4/4 José Luís Peixoto morreste-me As paredes voltaram a separar o inverno nocturno, permanente da casa e o ciclo alternado dos dias e do mundo, alheio a nós, para lá de nós. Comigo, a casa estava mais vazia. O frio entrava e, dentro de mim, solidificava. As várias sombras da sombra de mim, imóveis, passeavam-se de corpo para corpo, porque todos eles, todos meus, eram igualmente negros e frios. E abri a janela. Muito longe do luto do meu sentir, do meu ser, ser mesmo, o sol-pôr a estender-se na aurora breve solene da nossa casa fechada, pai. E pensei não poderiam os homens morrer como morrem os dias? assim, com pássaros a cantar sem sobressaltos e a claridade líquida vítrea em tudo e o fresco suave fresco, a brisa leve a tremer as folhas pequenas das árvores, o mundo inerte ou a mover-se calmo e o silêncio a crescer natural natural, o silêncio esperado, finalmente justo, finalmente digno. Pai. A tarde dissolve-se sobre a terra, sobre a nossa casa. O céu desfia um sopro quieto nos rostos. Acende-se a lua. Translúcida, adormece um sono cálido nos olhares. Anoitece devagar. Dizia nunca esquecerei, e lembro-me. Anoitecia devagar e, a esta hora, nesta altura do ano, desenrolavas a mangueira com todos os preceitos e, seguindo regras certas, regavas as árvores e as flores do quintal; e tudo isso me ensinavas, tudo isso me explicavas. Anda cá ver, rapaz. E mostravasme. Pai. Deixaste-te ficar em tudo. Sobrepostos na mágoa indiferente deste mundo que finge continuar, os teus movimentos, o eclipse dos teus gestos. E tudo isto é agora pouco para te conter. Agora, és o rio e as margens e a nascente; és o dia, e a tarde dentro do dia, e o sol dentro da tarde; és o mundo todo por seres a sua pele. Pai. Nunca envelheceste, e eu queria ver-te velho, velhinho aqui no nosso quintal, a regar as árvores, a regar as flores. Sinto tanta falta das tuas palavras. Orienta-te, rapaz. Sim. Eu oriento-me, pai. E fico. Estou. O entardecer, em vagas de luz, espraia-se na terra que te acolheu e conserva. Chora chove brilho alvura sobre mim. E oiço o eco da tua voz, da tua voz que nunca mais poderei ouvir. A tua voz calada para sempre. E, como se adormecesses, vejo-te fechar as pálpebras sobre os olhos que nunca mais abrirás. Os teus olhos fechados para sempre. E, de uma vez, deixas de respirar. Para sempre. Para nunca mais. Pai. Tudo o que te sobreviveu me agride. Pai. Nunca esquecerei.

Biographiewikipedia : José Luís Peixoto est diplômé en Langues et Littératures Modernes (anglais et allemand) à l'Université Nouvelle de Lisbonne[1]. Avant de se consacrer à l'écriture professionnelle, il a débuté dans le journalisme, dans la critique littéraire et dans l'enseignement. Il a travaillé en tant qu'enseignant à Praia, au Cap-Vert et dans plusieurs villes du Portugal. Il a publié de la poésie et de la prose. Il a reçu le Prix Jeunes Créateurs (domaine de la littérature portugaise) dans les années 1997, 1998 et 2000. Il a également reçu en 2008, le Prix Daniel Faria de poésie, créé par la mairie de Penafiel. En 2001, son roman Sans un regard a remporté le Prix littéraire José Saramago. Il est représenté dans plusieurs anthologies de la prose et de la poésie portugaises et internationales. En 2001, il publie A criança em ruínas, son premier recueil de poésie. Grâce à ses éditions successives, il atteint rapidement les 15 000 exemplaires vendus - un nombre très inhabituel pour un premier livre de poésie. Il est collaborateur de plusieurs publications nationales et internationales (Time Out, Jornal de Letras, Visão). En 2005, il écrit les pièces de théâtre Anathema (créé au Théâtre de la Bastille, Paris[2]) et A manhã (créé au Théâtre São Luiz, Lisbonne). En 2006, il publie le roman Le cimetière de pianos. En 2007, à Saragosse, ce roman reçoit le Prix Calamus - Otra Mirada, remis au meilleur roman étranger publié en Espagne cette année. En 2007 il a débuté la pièce Quando o inverno Chegar, au théâtre São Luiz à Lisbonne. Sans un regard (publié en Grande-Bretagne sous le titre Blank Gaze) faisait partie de la liste du Financial Times des meilleurs livres publiés en Angleterre en 2007. Ses romans sont publiés en France, Italie, Bulgarie, Turquie, Finlande, Pays-Bas, Espagne, République tchèque, Roumanie, Croatie, Biélorussie, Pologne, Brésil, Grèce, Royaume-Uni, États-Unis, Hongrie, Israël, etc. Étant traduit dans un total de 18 langues et étant distribué dans plus de 40 pays. Ses romans sont publiés dans quelques éditeurs les plus prestigieux du monde, comme Bloomsbury (Royaume-Uni), Doubleday / Random House (USA), Grasset et Folio / Gallimard (France), Einaudi (Italie), Record (Brésil), entre autres. En 2008, après la publication de Sans un regard aux États-Unis (sous le titre The Implacable Order of Things, ce roman a été inclus dans le semestriels Discover Great New Writers des livrairies Barnes & Noble, étant le seul roman de langue étrangère au sein de cette liste, il a fourni une exposition exceptionnelle à la plus grande chaîne de librairies aux États-Unis et dans le monde. En 2009, les livres Morreste-me et Gaveta de pápeis sont publiés en braille au Portugal. Au Portugal, à Ponte de Sor, il reçoit hommage, avec un nouveau Prix lancé avec son nom, le Prix Littéraire José Luís Peixoto[3] En 2010 il participe au Festival Passeurs de monde(s) à Poitiers

mercredi 5 juin 2013

Femmes dannées Baudelaire

A la pâle clarté des lampes languissantes,

Sur de profonds coussins tout imprégnés d'odeur

Hippolyte rêvait aux caresses puissantes

Qui levaient le rideau de sa jeune candeur.

Elle cherchait, d'un oeil troublé par la tempête,

De sa naïveté le ciel déjà lointain,

Ainsi qu'un voyageur qui retourne la tête

Vers les horizons bleus dépassés le matin.

De ses yeux amortis les paresseuses larmes,

L'air brisé, la stupeur, la morne volupté,

Ses bras vaincus, jetés comme de vaines armes,

Tout servait, tout parait sa fragile beauté.

Etendue à ses pieds, calme et pleine de joie,

Delphine la couvait avec des yeux ardents,

Comme un animal fort qui surveille une proie,

Après l'avoir d'abord marquée avec les dents.

Beauté forte à genoux devant la beauté frêle,

Superbe, elle humait voluptueusement

Le vin de son triomphe, et s'allongeait vers elle,

Comme pour recueillir un doux remerciement.

Elle cherchait dans l'oeil de sa pâle victime

Le cantique muet que chante le plaisir,

Et cette gratitude infinie et sublime

Qui sort de la paupière ainsi qu'un long soupir.

- " Hippolyte, cher coeur, que dis-tu de ces choses ?

Comprends-tu maintenant qu'il ne faut pas offrir

L'holocauste sacré de tes premières roses

Aux souffles violents qui pourraient les flétrir ?

Mes baisers sont légers comme ces éphémères

Qui caressent le soir les grands lacs transparents,

Et ceux de ton amant creuseront leurs ornières

Comme des chariots ou des socs déchirants ;

Ils passeront sur toi comme un lourd attelage

De chevaux et de boeufs aux sabots sans pitié...

Hippolyte, ô ma soeur ! tourne donc ton visage,

Toi, mon âme et mon coeur, mon tout et ma moitié,

Tourne vers moi tes yeux pleins d'azur et d'étoiles !

Pour un de ces regards charmants, baume divin,

Des plaisirs plus obscurs je lèverai les voiles,

Et je t'endormirai dans un rêve sans fin ! "

Mais Hippolyte alors, levant sa jeune tête :

- " Je ne suis point ingrate et ne me repens pas,

Ma Delphine, je souffre et je suis inquiète,

Comme après un nocturne et terrible repas.

Je sens fondre sur moi de lourdes épouvantes

Et de noirs bataillons de fantômes épars,

Qui veulent me conduire en des routes mouvantes

Qu'un horizon sanglant ferme de toutes parts.

Avons-nous donc commis une action étrange ?

Explique, si tu peux, mon trouble et mon effroi :

Je frissonne de peur quand tu me dis : " Mon ange ! "

Et cependant je sens ma bouche aller vers toi.

Ne me regarde pas ainsi, toi, ma pensée !

Toi que j'aime à jamais, ma soeur d'élection,

Quand même tu serais une embûche dressée

Et le commencement de ma perdition ! "

Delphine secouant sa crinière tragique,

Et comme trépignant sur le trépied de fer,

L'oeil fatal, répondit d'une voix despotique :

- " Qui donc devant l'amour ose parler d'enfer ?

Maudit soit à jamais le rêveur inutile

Qui voulut le premier, dans sa stupidité,

S'éprenant d'un problème insoluble et stérile,

Aux choses de l'amour mêler l'honnêteté !

Celui qui veut unir dans un accord mystique

L'ombre avec la chaleur, la nuit avec le jour,

Ne chauffera jamais son corps paralytique

A ce rouge soleil que l'on nomme l'amour !

Va, si tu veux, chercher un fiancé stupide ;

Cours offrir un coeur vierge à ses cruels baisers ;

Et, pleine de remords et d'horreur, et livide,

Tu me rapporteras tes seins stigmatisés...

On ne peut ici-bas contenter qu'un seul maître ! "

Mais l'enfant, épanchant une immense douleur,

Cria soudain : - " Je sens s'élargir dans mon être

Un abîme béant ; cet abîme est mon cœur !

Brûlant comme un volcan, profond comme le vide !

Rien ne rassasiera ce monstre gémissant

Et ne rafraîchira la soif de l'Euménide

Qui, la torche à la main, le brûle jusqu'au sang.

Que nos rideaux fermés nous séparent du monde,

Et que la lassitude amène le repos !

Je veux m'anéantir dans ta gorge profonde,

Et trouver sur ton sein la fraîcheur des tombeaux ! "

- Descendez, descendez, lamentables victimes,

Descendez le chemin de l'enfer éternel !

Plongez au plus profond du gouffre, où tous les crimes,

Flagellés par un vent qui ne vient pas du ciel,

Bouillonnent pêle-mêle avec un bruit d'orage.

Ombres folles, courez au but de vos désirs ;

Jamais vous ne pourrez assouvir votre rage,

Et votre châtiment naîtra de vos plaisirs.

Jamais un rayon frais n'éclaira vos cavernes ;

Par les fentes des murs des miasmes fiévreux

Filtrent en s'enflammant ainsi que des lanternes

Et pénètrent vos corps de leurs parfums affreux.

L'âpre stérilité de votre jouissance

Altère votre soif et roidit votre peau,

Et le vent furibond de la concupiscence

Fait claquer votre chair ainsi qu'un vieux drapeau.

Loin des peuples vivants, errantes, condamnées,

A travers les déserts courez comme les loups ;

Faites votre destin, âmes désordonnées,

Et fuyez l'infini que vous portez en vous !